domingo, 27 de outubro de 2013

Golijath

Natural de Schiedam, Holanda, nascido em data indeterminada por volta de 1610, Cornelis Bastiaanszoon Golijath, foi um dos cartógrafos que estiveram no Brasil holandês, desde os primeiros anos da conquista de Pernambuco.

Quando do ataque das tropas de Matias de Albuquerque, que saíam vencidas do Arraial do Bom Jesus, à Porto Calvo em 1635, Golijtah, que trabalhava como escrivão dos holandeses, foi capturado e enviado à Bahia e em seguida à Portugal. Conseguindo chegar à Holanda, ele retorna ao Brasil a tempo de participar do assalto de Nassau a Salvador em 1638, elaborando mapas do litoral e das fortificações da cidade, sendo esses documentos posteriormente enviados à Holanda. Após o retorno ao Recife da infrutífera expedição, Golijath continua seu trabalho na corte de Nassau, realizando levantamentos da costa e dos povoamentos do nordeste brasileiro, que foram levados à sede da WIC e aos Estados Gerais em abril de 1639.

Em 1641, enquanto seguia para Portugal como representante do Conde de Nassau para a aclamação do Rei D. João IV, o cartografo foi feito prisioneiro por piratas argelinos quando o navio em que viajava seguia da Ilha da Madeira para Lisboa. Após “passar pelas maiores misérias” segundo carta dele à Nassau, Golijath consegue voltar à Holanda onde se casa em 1644.

Pela terceira vez, Golijath volta ao Recife em julho de 1645, agora como capitão do navio Oranjeboom, permanecendo até março de 1646 quando parte para a Holanda. No ano seguinte é contratado como engenheiro da Ilha de Walcheren, província de Zeeland, Holanda.

No ano de 1648 foi publicado em Amsterdam, por Claes Janszoon Visscher um mapa, elaborado por Golijath, da região do Recife e Olinda, onde constam inúmeras informações da localização de casa, engenhos de açúcar, currais de gado, canaviais, fortes e trincheiras. Segundo o pesquisador José Antônio Gonsalves de Melo em seu excepcional trabalho A Cartografia Holandesa do Recife, esse é o melhor mapa do Recife elaborado durante o período holandês. Foi reeditado diversas vezes e inclusive, aparece no quadro do pintor neerlandês Cornelis de Man.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Recife, século XVII

Parece que o Recife -que os documentos antigos chamam simplesmente de "Povo"- era um triste burgo nos primeiros anos do século XVII. Burgo triste e abandonado, que os nobres de Olinda deviam atravessar pisando em ponta de pé, receando os alagados e os mangues; burgo de marinheiros e de gente ligada ao serviço do porto; burgo triste, sem vida própria, para onde até a água tinha de vir de Olinda.

O Recife foi, porém, desde os primeiros tempos uma tentação para os piratas mais afoitos, de olhos compridos nas riquezas da terra. Porque o Recife era, apesar de tudo, a porta de entrada da capitania.

José Antônio Gonsalves de Mello
Tempo dos Flamengos, 1947

domingo, 15 de setembro de 2013

Vrijburg

Chegando ao Recife em 23 de janeiro de 1637, Mauricio de Nassau ocupou inicialmente uma casa, na época, às margens do Rio Capibaribe, local atualmente numa esquina entre as ruas do Imperador e 1º de Março.

Apaixonado pela arquitetura e urbanismo, Nassau tratou de construir para sua residência oficial um prédio à altura de sua condição de nobre europeu e principal autoridade do Brasil holandês. Em 1639 adquiriu uma extensa área ao norte da Ilha de Antônio Vaz, hoje correspondente à Praça da República, Teatro Santa Isabel e Palácio do Campo das Princesas. Segundo Barleus, “Era uma planície safara, inculta, despida de arvoredo e arbustos”. Próximo, ocupando o local do atual Palácio da Justiça, já havia o Forte Ernesto, que foi instalado no Convento de Santo Antônio.

Em 1640 são iniciadas as obras do parque que incluíam um horto e zoológico onde eram mantidos diversos animais domésticos e selvagens do Brasil e África, e cultivadas plantas e arvores das mais variadas espécies, destacando-se um imenso coqueiral com exemplares transplantados por Nassau, procedentes de locais próximos e trazidos em barcaças.

O palácio seria denominado Vrijburg ou Friburgo, também conhecido como Palácio das Torres pelas duas partes quadrangulares elevadas nas laterais do prédio. Estas torres serviam como posto de observação e farol para os navios em demanda ao porto do Recife. Nos arredores do edifício principal havia cacimbas com água doce e três tanques de criação de peixes.

Seus salões estavam decorados com pinturas de motivos do país e objetos trazidos de várias partes do mundo, formando uma coleção de curiosidades como era moda na Europa de então. O Conde de Nassau, além de tratar dos assuntos oficiais da conquista, recebia as pessoas gradas nos jardins do palácio para festas e encontros culturais.

Voltando à Europa em 1644, Nassau não pode ver a constante modificação do Palácio Friburgo e do entorno para fazer frente às lutas da Restauração Pernambucana que culminou com a rendição dos holandeses em 1654 quando restava apenas o prédio principal.

Friburgo serviu de residência oficial a vários governadores da província de Pernambuco passando por diversas reformas até ser demolido em 1786. No local foi construído o prédio do Erário Régio, que por sua vez também foi demolido, surgindo em 1840 a nova sede do governo. O edifício passou por reformas em 1852, 1873 e 1922 quando assumiu o aspecto atual. O Palácio do Campo das Princesas, como é denominado hoje, está sofrendo intervenção para recuperação, devendo ser reinaugurado em 2014.

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Fortes do Recife

Forte de Bruyn – é um belo forte quadrangular situado entre o rio Beberibe e o mar, no caminho que vai para Olinda, com dois baluartes completos e dois meio-baluartes. Os meio-baluartes estão localizados do lado da maré e as extremidades deles estão ligadas umas ás outras por uma linha de paliçadas. No meio dessa linha fica uma cortina de madeira, à prova de tiro de mosquetes, para flanquea-la de ambos os lados. Em razão de sua localização não pode ter fosso, mas é cercado por duas linhas de paliçadas e com estacas por cima. Os quartéis, o corpo-da-guarda e as portas foram feitas conforme se requeria. A casa da pólvora é razoável e as baterias estão em perfeito estado, estando nelas montadas as seguintes peças: 02 24lb, 01 18lb, 02 16lb, 01 10lb, 02 8lb, 02 6lb, 02 cortadas 6lb e 02 3lb (14 peças de bronze).

Forte Waerdenburgh ou O Triângulo – foi primitivamente um forte quadrangular, na confluência dos rios Capibaribe e Beberibe, numa ilha, com três baluartes em direção das Salinas, de onde podia ser aproximado; o quarto angulo era em direção de Antônio Vaz e não tinha baluarte, porque desse lado esperava-se pouco perigo. Nesse reduto há uma pequena casa de pólvora e em cada bateria estão montadas as seguintes peças: 02 5lb e 02 3lb (bronze); 03 5lb e 02 4lb (ferro).

Castelo da Terra ou São Jorge – é um castelo quadrangular no caminho ou dique entre o forte de Bruyn e o Recife, todo construído de pedra de cantaria. Na direção do forte do Brum e da cidade de Olinda tem um bastião completo e um meio-baluarte, o qual baluarte completo e dois meios-baluartes flanqueiam três lados; o lado dório é curvado a modo de tenalha, de modo que também este parcialmente pode  ser flanqueado. Este castelo está servindo há algum tempo como hospital e não tem atualmente guarnição, mas dispõe das seguintes peças de ferro: 09 6lb, 01 10lb, 01 4lb.

Forte Ernesto – é um belo forte quadrangular que circunscreve o convento com dois baluartes completos e dois meios-baluartes, situados do lado do rio, cujos pontos extremos estão ligados entre si por um muro que corre ao longo do rio, no qual fica a saída. No meio desse muro fica uma estacada de madeira, que varre todo o muro que, sem isso, não teria flancos. Este forte tem uma muralha bem pesada e também um fosso largo, mas não profundo. O forte tem cinco baterias, além da estacada de madeira, as quais estão montadas assim: 01 24lb, 01 20lb, 01 16lb e 02 12lb (bronze); 02 13lb e 01 2lb (ferro).

Forte Frederico Henrique ou As Cinco Pontas – é um grande forte pentagonal regular, com baluartes completos e tem uma pesada muralha e parapeito em redor com uma paliçada de faxina. Dentro estão dois baluartes isolados com paliçadas contra o parapeito. De fora, em direção ao Amélia, ficam dois hornaveques, arruinados na maior parte, e com as frentes parcialmente desmanteladas. Tem cinco baterias nos pontos e dez nos flancos, com as seguintes peças: 02 24lb, 01 18lb, 05 12lb, 03 8lb, 04 6lb e 01 6lb (bronze); 02 16lb, 02 8lb e 3 6lb (ferro).

Forte Príncipe Guilherme – é um grande forte quadrangular regular, situado no rio dos Afogados, com quatro baluartes completos. Tem fortes muralhas e parapeitos, com duas banquetas fora, na berma, com uma paliçada, e fora desta um fosso bem largo e razoavelmente profundo. Dentro há bons quartéis, corpo da guarda e casa da pólvora, com uma nova porta abobadada, sobre a qual está o alojamento do comandante. As baterias estão montadas segundo as necessidades, assim: 02 24lb, 02 18lb, 01 12lb, 02 8lb, 02 5lb e 02 3lb (bronze); 01 6lb e 01 5lb (ferro).


Relatório dos Conselheiros Hamel, Bullestrate e Bas ao Conselho dos XIX
1646

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Olinda e Recife, 1630

Olinda era nesse tempo a capital da capitania de Pernambuco. Situada um pouco ao norte do cabo de Santo Agostinho é a cidade edificada em terreno elevado vizinho da costa. Contava, então, cerca de 2.000 habitantes, destacando-se várias pessoas abastadas e grande número de comerciantes em boa situação. Existiam quatro conventos de frades e um de religiosas, 130 eclesiásticos e 7 igrejas católicas.

Ao sul estende-se uma faixa de terra,  entre o rio Beberibe e o mar, no extremo da qual se formara um núcleo de gente humilde e onde se construiram armazéns e entrepostos dos negociantes de Olinda. Era esse povoado protegido pelo forte de São Jorge e tinha umas 150 casas. A pequena distância da costa há um arrecife que deixa de ser visível nas horas do preamar. Numa das pontas do arrecife, e defronte do forte de São Jorge, elevava-se o castelo de São Francisco todo de blocos de pedra e dominando inteiramente a entrada do porto. Entre os recifes e o continente, sobre outro banco de areia formado na embocadura do rio Capibaribe fica a ilha de Antônio Vaz.


Os Holandeses no Brasil
Pieter Marinus Netscher, 1853

domingo, 7 de julho de 2013

Pernambuco. O que significa?

... de este Pernambuco, vem próprio vocábulo, pernambuc (que quer dizer mar furado na lingoa do gentio). Ruy Pereira, 1561;

Em o meyo desta obra alpestre e dura,
Hua boca rompeo o Mar inchado,
Que na língua dos bárbaros escura,
Paranambuco, de todos He chamado
Bento Teixeira, 1601;

Este nome Pernambuco, derivado ou corrupção de Paranãbuca, com que os Cahetés designavam o Porto. Cazal, 1817;

Pernambuco não vem de Paraná-búca, nem significa boca do mar; porem vem de Pará-nã, rio, e de Mbucú ou Pucú, largo, longo; significando, Rio largo ou longo ou comprido. Os conhecimentos hydrographicos eram apenas rudimentares n’um povo infante e não admira que a linguagem se resinta desse estado de cousas. Ignacio Malta, 1859

As interpretações de Pernambuco, constantes das citações transcriptas, são: mar furado, cova do mar, pedra ou mar furado, excavado pelo mar, pedra furada ou buraco, rochedo cavado das águas, bocca do mar, rio largo ou longo ou comprido, braço de mar, mar cavando os rochedos, pedra furada, furo ou língua do mar. 
Baptista Caetano
Revista do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano,
1901

domingo, 30 de junho de 2013

O Castelo do Mar

Como local de importância vital para a ligação entre o Recife/Olinda e o resto do mundo, o porto do Recife precisava ser fortemente defendido, tanto de ataques vindos do mar, quanto por terra.

Em terra foi construído o Forte de São Jorge, próximo à entrada da barra. Sobre os arrecifes foi erguido o Forte de São Francisco também próximo a entrada dos navios. Os dois fortes deveriam cruzar fogo sobre qualquer embarcação ou tropa que ameaçasse o porto do Recife.

Apesar de ter sua construção ordenada desde 1591 pelo governador Francisco de Souza, o forte de São Francisco teve suas obras iniciadas apenas em 1612 por determinação do governador Duarte de Albuquerque Coelho e projeto de Tibúrcio Espanhochi. Foi concluído dois anos depois executado pelo engenheiro Francisco de Frias. O forte era conhecido por várias denominações como: Forte da Barra, Forte do Picão e Castelo do Mar. Era construído em pedra e, segundo o prof. Marcos Albuquerque, teve durante algum tempo forma eneagonal. Existe uma planta baixa portuguesa em que é mostrado como hexagonal.

Por sofrer ação contínua do mar, tinha que ser reparado com frequência, o que não havia ocorrido quando da invasão holandesa em 1630. O Castelo do Mar, bem como os outros fortes da área, foram cercados por mar e terra e após alguns dias de combate tiveram que se render as tropas da WIC.

Ocupado pelos holandeses foi restaurado e num relatório de 1646 dos conselheiros Hamel, Bullestrate e Bas é descrito como “um castelo octogonal sem flancos no arrecife e somente acessível com barcos, tendo sete peças de bronze, sendo: 01 de 20 libras, 02 de 18 libras, 01 de 16 libras, 01 de 12 libras e 02 de 10 libras."

Após a expulsão dos holandeses o Forte de São Francisco foi reocupado pelos portugueses e passou por várias reformas até ser desarmado e ter seus canhões transferidos para servir de ponto de atracação dos navios no arrecife. O local foi utilizado como posto fiscal da Fazenda até ser demolido em 1910 para obras de adequação do porto.

Em 1822 o forte, além de recuperado, ganhou um farol para orientação dos navios em transito pelo porto. O farol atualmente tem forma semelhante ao antigo Castelo do Mar e está presente no escudo de Pernambuco.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

As Solicitações do Conde de Nassau

A posição do Conde Maurício de Nassau ao comando do Brasil holandês foi de constante questionamento da Companhia das Índias Ocidentais (WIC), bem como dos Estados Gerais, parlamento dos Países Baixos, quanto aos meios ao seu dispor para manter e ampliar os territórios conquistados, além de promover a produção e transporte do açúcar e outros produtos da terra para a Holanda.

Desde sua nomeação como Governador e Capitão Geral de Terra e Mar do Brasil em 1636, Nassau teve promessa de receber enormes recursos em homens e apetrechos para sustentar a “Guerra Brasílica” e fazer valer a pena os investimentos da WIC na conquista. De inicio, para sua viagem ao Brasil, foi acertada uma esquadra de 32 navios e um exército de 7.000 combatentes. Apesar dos extensos recursos envolvidos, não era nada de extraordinário em comparação com a frota de invasão do almirante Loncq (67 navios) e os 7.300 homens da força expedicionária do general Waerdenburch que surgiram no litoral de Pernambuco em fevereiro de 1630.

Na realidade, o Conde de Nassau e sua comitiva de artistas, cientistas e engenheiros aportou em Recife com apenas 4 navios e 2.700 soldados. Apesar de parente próximo do próprio príncipe de Orange, Frederik Hendriks, Nassau nunca receberia os recursos que tanto cobrava em dezenas de cartas e relatórios aos Heeren XIX, conselho administrativo da WIC e aos Estados Gerais.

Antes da chegada do Governador, membros da WIC sediados no Recife e em outros pontos do Brasil holandês já alertavam as autoridades dos Países Baixos para as carências que dificultavam a vida aqueles presentes na conquista neerlandesa. Em 06 de novembro de 1636 o conselheiro Willem Schoot escreve relatório pedindo soldados e um comandante enérgico que pudesse conduzi-los.

Nassau solicitava também que fossem enviados da Europa, principalmente Holanda e Alemanha, colonos que pudessem ocupar os imensos territórios vagos e passíveis de suportar culturas que iriam alimentar a população que então dependia, em quase tudo, de produtos importados pela WIC.

Além da falta de tropas frescas e material bélico, Nassau alertava para as guarnições navais e terrestres que havia muito tinham excedido seu tempo de serviço contratado pela WIC e reclamavam seu retorno à Europa. Isso sem contar os soldos em atraso que provocavam desde excessos de bebida até a deserção para o lado inimigo.

Mesmo após sua volta à Holanda em 1644, Maurício de Nassau continuou reclamando aos Estados Gerais e à Companhia das Índias Ocidentais a entrega de meios para a manutenção do Brasil holandês. Seus protestos, bem como os de vários outros civis e militares graduados e engajados desde o Maranhão até o Rio São Francisco não encontraram eco em Haia nem Amsterdã e os vastos territórios do Brasil e da África, conquistados com tanto sangue e florins voltaram para os portugueses que mal podiam cuidar do seu próprio país, então acossado por espanhóis e neerlandeses.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Recife, Cidade Sitiada

"Entretanto, enquanto as cousas se desenrolavam com fortuna vária e os socorros da Holanda tardavam, a penúria se acentuava diariamente no Recife.

Os gatos e cachorros, dos quais tínhamos então abundância, eram considerados finos petiscos. Viam-se negros desenterrando ossos de cavalo, já meio podres, para devorá-los com incrível avidez. Nem era menos insuportável a falta de água potável, devido ao rigor do verão e ao uso constante de carnes salgadas; todos os poços que se abriam minavam água salobra.

Finalmente a situação se agravou de tal sorte que mesmo a ração de uma libra [453 g] de pão por semana foi suspensa ao povo para ser concedida aos soldados que, induzidos pelos portugueses e atraídos por uma ração dobrada, começaram a desertar rapidamente.

Quando já tinhamos atingido ao auge da penúria e devorado todos os cavalos, gatos, cachorros e ratos, e um alqueire [15 Kg] de farinha chegou a ser negociado à razão de 80 e 100 florins, finalmente, a 22 de junho avistamos dois navios desfraldando o pavilhão do Príncipe, que rumavam para o Recife a todo pano. Esses dois navios, denominados Valk e Elizabeth foram fretados pela Câmara de Amsterdã e haviam zarpado de Texel a 26 de abril.

Os capitães de ambos os navios receberam medalhas de ouro com a seguinte inscrição: O Falcão e o Elizabeth salvaram o Recife."


Descrição de Joan Nieuhof (Memorável Viagem Marítima e Terrestre ao Brasil) do cerco imposto pelos luso-brasileiros aos holandeses no Recife a partir de 1645, quando a única via de acesso à cidade era por mar, ainda dominado pelos neerlandeses.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

O Governador dos Negros

Até o ano de 1633 quase não existe informação confirmada sobre o negro Henrique Dias.

Não se sabe o ano de seu nascimento. O certo é que era pernambucano.

Francisco de Brito Freyre, almirante português, afirma que ele nasceu escravo, enquanto Duarte Coelho Pereira, donatário de Pernambuco, relata sua condição de homem livre.

Henrique Dias apresentou-se em 14 de maio de 1633 ao general Matias de Albuquerque no Arraial do Bom Jesus, juntamente com sua tropa de negros. A situação dos luso-brasileiros só fazia piorar após a deserção de Calabar, que levou os holandeses a diversas conquistas. Dias permaneceu no Arraial mesmo depois da rendição que ocorreu por não haver mais mantimentos nem munição no forte.

Se ferimentos em combate podem medir a coragem de um soldado, Henrique Dias foi o mais corajoso da chamada Guerra Brasílica. Quase uma dezena de relatos atestam os danos recebidos por ele, inclusive aquele no combate de 18 de fevereiro de 1637 em Mata Redonda, Alagoas, onde um pelouro destroçou sua mão esquerda que teve de ser amputada acima do pulso.

No ataque que Maurício de Nassau procedeu a Salvador em 1638, Dias integrou a tropa de veteranos de Pernambuco que ajudou a defender a então capital do Brasil e fez retroceder os homens da Cia. das Índias Ocidentais.

Em 1639 chega ao Brasil o Conde da Torre, Governador e Capitão General de Terra de Mar, com a missão de recuperar os territórios tomados pelos holandeses. São enviados ao Brasil holandês os chamados campanhistas, guerrilheiros que deveriam atacar as posições neerlandesas e queimar seus canaviais. Entre eles estava Henrique Dias com seus negros.

No final de 1639 a tropa de Henrique Dias integra uma poderosa força que embarca para atacar os invasores holandeses no Recife e em outros pontos da costa nordestina. A missão não tem sucesso e após diversos confrontos com navios neerlandeses a frota luso-hispana é fragmentada e em parte destruída. Os homens de Dias desembarcam em Pipa, Rio Grande do Norte retornando pelo interior, onde se engajam em diversos combates com os holandeses até alcançarem a Bahia.

Em 1645 tem início as batalhas pela Restauração Pernambucana: Monte das Tabocas, Casa Forte, Cabo, etc. O Terço de negros de Henrique Dias está sempre na vanguarda dos combates e seu comandante vai colecionando vitórias e mais ferimentos.

Os luso-brasileiros cercam os holandeses praticamente no Recife e Dias se instala em habitações à margem do Capibaribe, atual bairro dos Coelhos, tão próximo ao inimigo que as escaramuças são diárias.

No inicio de 1648 ele e seu Terço seguem para o Rio Grande do Norte a fim de expulsar os neerlandeses da capitania. Na volta a Pernambuco atua bravamente na 1ª Batalha dos Guararapes (19 de abril). Quase um ano depois vem a 2ª Batalha dos Guararapes (18 de fevereiro) e Henrique Dias é mais uma vez ferido, com um tiro no flanco.

A rendição dos holandeses ocorre em 27 de janeiro de 1654 no Recife. Em março daquele ano H. Dias acompanha André Vidal de Negreiros a Portugal, onde este comunica ao rei D. João IV a vitória das armas luso-brasileiras sobre os neerlandeses. Henrique Dias escreve ao rei solicitando as benesses prometidas por seus comandantes durante a guerra de libertação.

Pela coragem extrema e derramamento de seu próprio sangue em situações diversas, a 27 de abril de 1654 o rei de Portugal concede por decreto ao negro Henrique Dias a comenda dos Moinhos do Soure da Ordem de Cristo com todas as honras devidas. Ao voltar a Pernambuco o general Barreto de Menezes, comandante do exército luso-brasileiro, expede alvará concedendo a Dias algumas casas no Recife, as mesmas que ele e seus homens haviam ocupado no cerco aos invasores junto ao Capibaribe.

Em 1656 o fidalgo negro volta a Portugal. Sua missão agora é garantir aos seus bravos comandados a liberdade que seus senhores lhes haviam prometido para lutarem pela liberdade do Brasil. Pedia ainda que seu Terço de homens negros fosse equiparado aos demais Terços de combatentes das forças portuguesas no Brasil. O Conselho Ultramarino atendeu ao pedido de Henrique Dias, seu Terço foi mantido e ele recebeu a patente de Mestre-de-Campo.

O grande patriota Henrique Dias morreu a 07 de junho de 1662 no Recife, sendo enterrado no Convento de Santo Antônio. Era casado e teve quatro filhas.

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Joan Nieuhof

Natural da cidade de Uelzen, norte da Alemanha, Joan Nieuhof nascido em 22 de julho de 1618, alistou-se na Cia. das Índias Ocidentais (WIC) em 1640 chegando ao Brasil em dezembro do mesmo ano na condição de comissário.

Esteve em Pernambuco por mais de 8 anos, voltando à Holanda em julho de 1649. Contratado pela Cia. das Índias Orientais (VOC), segue para a Batávia, colônia holandesa na Indonésia, China, Ceilão, Malabar e Sumatra. Tendo como missão negociar com os príncipes da costa do Malabar, chegou a ser governador do Ceilão.

Voltou a Holanda em 1670, tendo sido enviando dois anos depois para a ilha de Madagascar onde desapareceu em viagem pelo interior. Foi enviada uma expedição pela VOC para localiza-lo, mas sem sucesso.Em sua estada na Holanda, entregou a seu irmão Hendrick Nieuhof os originais de um livro que seria publicado em Amsterdam, 1682 com o título: Zee em Lant Reize door verscheidene gewesten van Oost Indiae (Viagem Marítima e Terrestre por Diversas Regiões da Índia Ocidental).

No livro, Nieuhof descreve em pormenores desde sua viagem da Holanda ao Recife até aspectos geográficos das capitanias do Brasil holandês, seus habitantes, animais e plantas. São abordadas as negociações entre os holandeses e o governo de Salvador para cessação das hostilidades no Brasil, bem como os subornos propostos por ambos os lados para a tomada de fortificações e a deserção de civis e militares. São descritos vários combates da guerra que assolava a colônia tanto em terra quanto no mar.

A narrativa não segue uma linha lógica, estando misturados diversos assuntos diferentes. Vários trechos do livro, notadamente aqueles que tratam da fauna e da flora, são copiados dos trabalhos de Georg Marcgrave e de Willem Piso. Assim mesmo, trata-se de importantíssimo documento de um alto funcionário da WIC que esteve por quase uma década no Brasil holandês.

O livro foi publicado em inglês em 1703 e em português (1981) segundo tradução de Moacir Vasconcelos e comentários de José Honório Rodrigues, confrontado com a edição holandesa. O título em português é: "Memorável Viagem Marítima e Terrestre ao Brasil".

domingo, 10 de março de 2013

A Escolha de Nassau

"Era essa mais ou menos a situação do Brasil e da América, quando Nassau assumiu o governo. Todos o desejavam nesse posto, porque, prático na milícia européia, sob o Príncipe de Orange, reconquistara, com sua dedicação e diligência, o que antes dele ninguém conseguira, a praça de Schenken, a qual, situada no divórcio das águas do Reno, defende a Batávia.
 

Gozava ele por isso o favor público dos holandeses, acrescendo a esses títulos o lustre de sua família, ligada pelo sangue aos imperadores e por matrimônio aos reis, além da autoridade, da galhardia, da lealdade, da boa fortuna e de outras muitas virtudes e honras. Tudo isso exigia fosse ele arrastado sem detença ao comando supremo e não consultado em longas deliberações. Demais, ostentava ele no porte e no corpo a bizarria e gentileza não só própria de idade viril, mas também congruente na dignidade com a relevância do seu alto cargo. Para auxiliar os príncipes alemães, já antes participara, como cavaleiro, da expedição que, sob Frederico Henrique de Nassau, se mandara ao Palatinado contra o Marquês de Spinola.

Fora alferes e comandara como capitão uma companhia, subindo logo de posto, sob Ernesto, governador de Frísia, e depois sob o príncipe Maurício de Orange, stathouder de Holanda, Zelândia e Frísia. Sob S. A. o príncipe Frederico Henrique, já supremo defensor das Províncias-Unidas, celebrizou-se Nassau nos famosos assédios de Groel, Bois-le-Duc, Vanloe, Maestricht (onde sustentou e repeliu com valentia o ataque contra a sua posição feito por Pappenheim, general das forças imperiais) e de Rheinberg. Assim, depois de desempenhar, no Velho Mundo, todas as funções militares, viria exercer outras novas no Novo Mundo.


Acompanhava-o a opinião – era verdadeira – de que se lhe dava a província do Brasil, não por insinuação ou pedido seu, mas por ser dela julgado digno e capaz. A voz pública não errava, antes escolhia o melhor. E o que é mais para louvar, logrou ele, por suas virtudes, fosse a Companhia antes pedir de empréstimo um governador aos alemães que escolhê-lo entre os próprios holandeses. Os Estados-Gerais e o Príncipe de Orange ratificaram os poderes a ele conferidos pelos diretores da Companhia.

A princípio foi prometida ao Conde uma esquadra de trinta e duas naus para ele ir tentar fortuna no Novo Mundo. Entretanto os diretores, diminuindo a sua avidez de ousadias, convieram depois em doze, que levariam 2.700 soldados.

Para evitar uma delonga prejudicial, companheira das grandes empresas, Nassau, já disposto para os trabalhos e as fadigas, resolveu partir numa esquadra ainda desapercebida, como acontece de ordinário em tais circunstâncias, e com soldados mal aprestados, com os quais ia passar à América, em quatro navios somente.


No outono do ano da graça de 1636, zarpou ele do porto de Texel, com o pleno assentimento e a mais firme esperança de todas as classes sociais. O navio que conduziu o capitão-general tinha o nome de Zutphen. Os soldados não excediam 350, que mal o garantiriam contra os ataques dos espanhóis de Flandres e de Dunquerque.


À sua partida, foram dele despedir-se e levar-lhe os votos de felicidade e boa viagem os membros dos Estados-Gerais, o Príncipe de Orange, os diretores da Companhia e os cidadãos mais considerados, persuadidos de que iria ele dar um exemplo novo de felicidade e de sabedoria política e militar."

Gaspar Barléus
Rerum per Octenium in Brasilia...
Amsterdam, 1647

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Zacharias Wagener

Nascido em Dresden, Alemanha, no dia 10 de maio de 1614, Zacharias Wagener, filho de um pastor protestante, ainda jovem foi para Hamburgo e em seguida trabalha na livraria de Joan Blaeu, afamado editor de Amsterdam. Em 1634 alista-se na Cia. das Índias Ocidentais e é enviado ao Recife como soldado.

Com a chegada de Maurício de Nassau em 1637, Wagener, que já aprendera a língua portuguesa e convivia com os índios, é nomeado despenseiro do Conde. Influenciado pelos artistas da corte de Nassau, Wagener passa a registrar através de aquarelas, aspectos da fauna, flora e dos habitantes do Brasil holandês.

Zacharias Wagener colecionou 109 aquarelas em um livro denominado Thier Buch (Livro dos Animais). Neste trabalho estão representados mamíferos, aves, peixes, crustáceos, insetos, vermes, diversas frutas e plantas encontrados no Brasil holandês. Wagener pintou também índios, negros e mestiços que habitavam nossa terra naquela época. Todas as figuras eram acompanhadas do nome e às vezes de uma descrição. Mostrou cenas do cotidiano do Recife, inclusive da Rua dos Judeus (hoje Rua do Bom Jesus) quando da venda de escravos africanos.

Wagener, apesar de ter convivido com artistas e intelectuais desde a Europa, não tinha formação científica nem artística, mas foi um dos primeiros a retratar a fauna, flora e habitantes não europeus do Brasil e um dos poucos a apresentar o que ele próprio viu. Procurou faze-lo de maneira fidedigna, afastando as crenças fantasiosas sobre animais e plantas monstruosas que as pessoas do Velho Mundo acreditavam existir na América.

Em 1641, Zacharias Wagener voltou para a Europa, primeiro para a Holanda e depois seguindo para a Alemanha a fim de rever sua família. Como aventureiro que era, poucos meses depois retorna a Amsterdam onde alista-se agora na Cia. das Índias Orientais (VOC) viajando por todo o Oriente. Ocupou diversos cargos de expressão na VOC inclusive o de Governador da Cidade do Cabo. Morreu em 1° de outubro de 1668 em Amsterdam, onde foi enterrado.

No Thier Buch estão as oito figuras humanas (índios e negros) que foram posteriormente pintadas por Albert Eckhout na Holanda com pequenas alterações e com estética mais suave.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

Pernambuco: tradição de revolução e liberdade

Após expulsar os holandeses em 1654, o sentimento nativista pernambucano mantém a tradição libertária e revolucionária que se mostra em várias ocasiões contra o poder central monarquista. O povo pernambucano não aceita a imposição de leis e a cobrança de impostos exorbitantes aos seus filhos que, no dizer do poeta César Leal, "edificaram a fogo, a faca e patas de cavalos o orgulho nacional em Guararapes."

Em 1666, foi nomeado pelo rei D. Afonso VI, como governador da província de Pernambuco o general português Jerônimo de Mendonça Furtado. Os pernambucanos esperavam que o cargo fosse ocupado por uma liderança local em face da reconquista desta parte do Brasil pelos homens da terra. O governador Furtado foi apelidado de Xumbergas por usar um bigode semelhante ao do general alemão Von Schomberg, que lutara na guerra de restauração do trono português. Ele se indispôs com os líderes locais e terminou por ser preso durante uma procissão organizada por eles no dia 31 de agosto daquele ano. Da fortaleza do Brum foi enviado a Bahia e posteriormente a Portugal.

O confronto com os portugueses teve novo episódio em 1710 com a elevação do Recife a condição de Vila. Os homens tradicionais de Olinda, sede da província, não aceitaram a situação da nova vila onde viviam os mascates portugueses e os atacaram, destruindo o pelourinho e provocando a fuga do governador Sebastião de Castro Caldas para a Bahia. Esses eventos ficariam conhecidos como a Guerra dos Mascates.

O mais importante movimento separatista e republicano de Pernambuco ocorreu em 1817 e chegou a se espalhar pelas províncias vizinhas. Os maçons do Recife divulgavam os ideais de liberdade e igualdade para todos, inclusive na libertação dos escravos. Os religiosos também tiveram papel relevante na disseminação dos regimes implantados nos Estados Unidos (1776) e França (1789).

Informado da revolta iminente, em 06 de março de 1817 o governador Caetano Pinto de Miranda Montenegro convoca os oficiais comandantes do Recife para prender os civis e militares apontados como conspiradores. O capitão José de Barros Lima, o "Leão Coroado", ataca o brigadeiro português Manuel Barbosa de Castro, que acusava os oficiais pernambucanos, dando início a revolta. O governador Montenegro, seus familiares e outros portugueses foram presos e enviados ao Rio de Janeiro. Foi nomeado um governo provisório e encaminhados emissários às províncias da Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Bahia, além de Estados Unidos e Inglaterra. Uma nova bandeira foi instituida que é até hoje a bandeira de Pernambuco.

O mais importante é que, pela primeira vez no Brasil, foi proclamada a liberdade de pensamento, de religião e da imprensa além da liberdade progressiva dos escravos. Em maio, o governo imperial envia tropas e navios de guerra para sufocar a rebelião e acaba com o sonho liberal pernambucano.

Sete anos depois (1824) eclode nova revolta em Pernambuco que ficou conhecida como Confederação do Equador. Em 1823, D. Pedro I havia dissolvido a Assembléia Constituinte e centralizado fortemente o poder. O presidente da província Francisco Paes Barreto é pressionado pelos liberais republicanos e renuncia ao cargo. Pedro I envia duas belonaves ao Recife para reempossar o antigo presidente mas, sem sucesso. Resolve então nomear outro presidente, Mayrink Ferrão, mineiro ligado aos liberais que também é rejeitado pelos revoltosos no Recife. Em 02 de julho é proclamada a independência da Província de Pernambuco, sendo enviados emissários às províncias vizinhas para formar a Confederação do Equador. Em agosto, o imperador manda uma esquadra com tropas para dominar o Recife. O comandante, o inglês Thomas Cochrane, tenta convencer os separatistas a se renderem não obtendo resposta positiva. As tropas imperiais que haviam desembarcado em Maceió e receberam a adesão dos fiéis a D. Pedro I chegam ao Recife e conseguem reconquistar a cidade.

As lideranças do movimento foram presas, destacando-se frei Caneca, que foi condenado a morte e executado em 13 de janeiro de 1825 nos muros do Forte de Cinco Pontas.

Em represália aos movimentos libertários, Pernambuco teve seu território apartado das Comarcas de Alagoas em 1817 e da Comarca do São Francisco em 1824. Perdemos mais de 150.000 km² de terras que foram provisoriamente tomadas como castigo imposto pelos poderes imperiais.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Calabar

Dentre as várias figuras polemicas que povoam as páginas históricas do Brasil holandês, sem dúvida, a mais destacada foi a de Domingos Fernandes Calabar.

Nascido no ano de 1609, filho de um português e uma negra, na Capitania de Pernambuco, povoação de Porto Calvo, hoje Alagoas, Calabar foi educado pelos padres jesuítas. Praticou o contrabando e chegou a possuir algumas terras. Quando os holandeses invadem Pernambuco em fevereiro de 1630, Calabar ingressa nas forças de resistência e combate duramente as tropas da Cia. das Índias Ocidentais (WIC).

Em 20 de abril de 1632 Calabar passa para o lado dos invasores. Profundo conhecedor da geografia da região e com bom relacionamento com os índios, orienta os holandeses na conquista de diversas localidades, dentre as quais Igarassú, Rio Formoso, Itamaracá, Cabo, Paraíba e Rio Grande do Norte.

Aprendeu rapidamente a língua holandesa e devido aos seus bons serviços privava da amizade dos comandantes e dos conselheiros da WIC.

Em 06 de junho de 1635 cai o Arraial do Bom Jesus, último baluarte luso-brasileiro na região de Olinda e Recife. As tropas remanescentes de Matias de Albuquerque seguem juntamente com os retirantes do Bom Jesus para Salvador, Bahia. Na passagem por Porto Calvo, conseguem tomar aquela vila, então sob o comando do major Alexander Picard. Calabar, que se encontrava em Porto Calvo, é sumariamente julgado e condenado a morte por traição. Foi executado em 22 de julho de 1635, sendo garroteado e em seguida esquartejado. Seus restos mortais foram expostos na estacada da vila.

Não se sabe ao certo os motivos da deserção de Calabar. Cita-se o assassinato de uma mulher e também desfalques nos cofres da Coroa. A deserção era fato comum naqueles tempos, haja visto os maus-tratos aos negros, índios e mestiços e as perseguições religiosas por parte dos portugueses. Pelo lado dos holandeses vale lembrar que o exército da WIC era composto em sua grande maioria por mercenários, sem contar com a falta de alimentos, armas e vestuário para os invasores.

O historiador Evaldo Cabral de Mello afirma que Calabar foi morto para não divulgar informações que tinha sobre o colaboracionismo com os holandeses de pessoas destacadas na sociedade portuguesa em Pernambuco. O frei Manuel Calado que ouviu sua confissão antes da execução diz que Calabar havia citado que não eram os mais humildes os culpados pela colaboração com os invasores.

Pelos bons serviços prestados, os holandeses concederam uma pensão de oito florins por mês a cada um dos três filhos de Domingos Fernandes Calabar.


sábado, 19 de janeiro de 2013

A Escravidão no Brasil Holandês

A escravidão era comum a quase todas as civilizações da antiguidade, sendo praticada em culturas do oriente, oriente médio e ocidente.

No Novo Mundo a escravidão já existia entre os índios, que escravizavam os vencidos nas guerras. Com a chegada dos espanhóis e portugueses os escravos eram comercializados com os colonizadores. No Brasil, os índios não se prestavam aos duros trabalhos que lhes eram impostos, como a extração do pau-brasil e o cultivo da cana-de-açúcar, sendo substituídos pelos negros africanos. Como os negros eram considerados infiéis e por isso inimigos da Igreja Católica, o Papa Eugênio IV já havia autorizado em 1436 a escravatura dos africanos.

Com o aumento da produção açucareira no final do século XVI, o tráfico negreiro cresceu assustadoramente, estimando-se em 30.000 negros sequestrados da África para trabalharem no Brasil até 1600, principalmente nas lavouras de cana-de-açúcar.

Os invasores holandeses logo observaram que o braço escravo era imprescindível à produção do açúcar, seu objetivo primário, tratando de implantar entrepostos na própria África para garantir um fluxo constante de negros para os engenhos do Brasil holandês. Nassau envia expedições à São Jorge da Mina e São Paulo de Luanda conquistando as fortalezas portuguesas daquelas localidades.

Os escravos eram transportados em condições sub-humanas, amontoados em navios sem nenhuma higiene e quase sem alimento e água. A mortandade era tamanha que o próprio Nassau, em 1644, envia relatório aos Estados Gerais na Holanda assinalando que um quarto dos negros embarcados na África morria devido às péssimas condições da travessia.

A Cia. das Índias Ocidentais traficava e vendia os negros escravos para os senhores-de-engenho com grande lucro. Eram comprados na África por valores entre 12 e 75 florins e vendidos no Recife, na Rua dos Judeus, por 200 a 300 florins. Os escravos eram utilizados, além da cultura da cana e produção açucareira, nas tarefas domésticas, na extração do pau-brasil, na criação de gado e também como soldados nas guerras.

O engenheiro e historiador Roberto Simonsen em seu livro História Econômica do Brasil (1937) estima que 350 mil negros foram trazidos da África para o Brasil no século XVII.  

A importância dos escravos no Brasil era tão evidente que o padre Antônio Vieira afirmou em 1648: Sem negros não há Pernambuco.